O que muda nos mercados de capitais com os novos padrões de divulgação de ESG pelas empresas?

Essa é a primeira vez que é sugerido o uso de uma linguagem comum de base global para que as empresas divulguem, em suas perspectivas, quais são os efeitos dos riscos e das oportunidades relacionados ao clima e à sustentabilidade

Por Gabriela da Cunha, Valor Investe — Rio

As principais bolsas de valores em todo o mundo, como Nova York, Londres, Frankfurt, entre outras, começaram a sediar eventos para marcar o lançamento, no fim de junho, de novos padrões internacionais para as empresas fazerem divulgações relacionadas à sustentabilidade. Disponível por ora de forma voluntária para todas as empresas, o IFRS S1 e IFRS S2 são as primeiras normas elaboradas pelo Conselho Internacional de Padrões de Sustentabilidade (ISSB, na sigla em inglês), que é uma espécie de irmão do Conselho de Normas Internacionais de Contabilidade (Iasb, em inglês), e que emite há décadas os padrões IFRS para serem seguidos na contabilidade, em mais de 100 jurisdições, inclusive no Brasil.

A padronização desse tipo de divulgação é relevante para ajudar a melhorar a compreensão e a confiança nos dados, ao mesmo tempo em que gera desafios para a implementação.

Essa é a primeira vez que é sugerido o uso de uma linguagem comum de base global para que as empresas divulguem, em suas perspectivas, quais são os efeitos dos riscos e das oportunidades relacionados ao clima e à sustentabilidade para seus negócios no curto, médio e longo prazo.

Uma das regras do ISSB exige que as empresas divulguem riscos significativos relacionados ao clima, como inundações e outros eventos climáticos extremos. Outra estabelece requisitos para a divulgação de informações sobre como as empresas gerenciam, medem e monitoram certos riscos e oportunidades relacionados à sustentabilidade. As normas para a integração dessas questões nas demonstrações financeiras tem caráter voluntário, não sendo uma obrigatoriedade.

Magnus Chaib, sócio da KPMG, explica que esse primeiro conjunto de normas está focado na divulgação e integração dos riscos climáticos, mas que os prováveis efeitos vão além.

“Temos a convicção de que uma série de outras normas cobrindo todos os aspectos da agenda ambiental, social e de governança [ESG] serão trabalhadas e anunciadas nos próximos anos. Uma série de informações financeiras e não-financeiras relacionada à agenda ESG passarão a se integrar com aquilo que, atualmente, já é exigido e divulgado nas demonstrações financeiras”.

Na prática, o IFRS S1 e IFRS S2 se baseiam em outras estruturas existentes focadas no investidor, como os padrões SASB (Conselho de Padrões Contábeis de Sustentabilidade), CDSB (Climate Disclosure Standards Board) e TCFD (Força-Tarefa sobre Divulgações Financeiras Relacionadas ao Clima), por exemplo. As novas normas foram desenvolvidas para serem usadas em conjunto com quaisquer requisitos contábeis e as empresas, incluindo as de capital fechado, podem começar a aplicar os padrões voluntariamente em seus relatórios a partir de 2024.

As discussões dos padrões IFRS S1 e IFRS S2 são resultado do grupo criado a partir da Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima de 2021. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) acompanhou o desenvolvimento das normas e ressalta que, por hora, nada muda no mercado de capitais brasileiro.

“Até o momento, ainda não há qualquer decisão regulatória quanto à aplicação das normas emitidas pelo ISSB, ou outro organismo internacional […] e qualquer decisão quanto ao assunto será objeto de amplo debate com os participantes do mercado por meio de audiências e consultas públicas”, diz a CVM em nota.

Marcella Ungaretti, responsável pela área de pesquisa de ESG da XP, destaca o que será necessário caso tais regras sejam aplicadas formalmente por aqui.

“Por parte das companhias locais, é necessário evoluir em termos não só a quantidade de informações ESG divulgadas, mas também em relação à qualidade. Embora a gente veja que uma grande evolução nos últimos anos, em termos de maior transparência, ainda existe um caminho adiante para atingirmos o estágio ideal – o que podemos comparar, por exemplo, com a divulgação de informações financeiras, em que existe um padrão, além de uma recorrência necessária”.

Os avanços alcançados até aqui se dão, em boa parte, pela adoção de normas contábeis globais que foram traduzidas, avaliadas e avalizadas e então colocadas em vigor no mercado local especialmente a partir de 2008. E, também, pela constituição, em 2022, do Comitê Brasileiro de Pronunciamentos de Sustentabilidade (CBPS), que trabalha para que as normas propostas pelo Fundação IFRS, criadora do ISSB, ganhem aplicabilidade por aqui.

Ainda assim, o IFRS S1 e IFRS S2 podem gerar mudanças e das grandes. Basta olhar para empresas brasileiras da bolsa que possuem relatório de sustentabilidade. Mesmo com a resolução nº 59/21 da CVM, que entrou em vigor a partir do dia 2 de janeiro de 2023 definindo regras de divulgação ESG mais rígidas para companhias abertas, apenas 21% das 447 companhias listadas na B3 já contavam com relatório de sustentabilidade. Ao olhar para só aquelas que fazem parte do Ibovespa, o cenário é melhor: das 88 companhias, 62 já tem a prática em sua gestão (71%), segundo mapeamento liderado por Ungaretti da XP.

É claro que o desafio não se dá apenas no cenário doméstico. A gestora britânica Schroders, que tem atuação global e é a quinta maior investidora em ações na B3, apoiou o trabalho de desenvolvimento dos padrões ISSB e vê a adoção e a implementação pelas empresas como “um passo crítico para lidar com a falta de consistência que existe atualmente nos relatórios de sustentabilidade”, diz Whitney Sweeney, diretora de Investimentos para Sustentabilidade da Schroders em Nova York.

Nos Estados Unidos, por exemplo, empresas e diretores financeiros ouvidos pelo “The Wall Street Journal” demonstraram estar preocupados sobre como as regras do ISSB vão interagir com os requisitos de outros países. De maneira geral, os executivos estão hesitantes em agir rápido demais e ir além do necessário ou ter que retroceder para cumprir um conjunto fragmentado de requisitos. Eles esperam que o país adote uma abordagem mais suave por meio de regras ainda não concluídas do regulador do mercado de capitais (SEC, na sigla em inglês) , devido à resistência de investidores.

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